*Diário Pessoal*
“Não te passou pela cabeza que 50 anos é tarde demais para ter filhos?” repreenderam-me os familiares ao telefone.
Tenho 46. Há um mês, dei à luz gémeos um menino, Artur, e uma menina, Leonor. Não consigo descrever o que sinto ao olhar para eles. Felicidade, alegria, lágrimas, um calor que me invade por dentro. Uma explosão de amor, sem exagero.
Mas nem a minha mãe nem a minha irmã vieram à maternidade. Os parentes do meu marido também ignoraram o nascimento. Tudo por causa da nossa idade.
Nunca pensei em ter filhos, confesso. Era jovem, vivia sem preocupações, passava noites em discotecas. O que mais poderia querer? Coquetéis, namoriscos, festas até de madrugada. Sentia-me no topo do mundo.
Aos 22, conheci o Guilherme. Alto, de óculos e barba bem feita, com um humor irresistível. As raparigas caíam a seus pés, mas ele escolheu-me a mim. E, admito, isso subiu-me o ego. Ele tinha apartamento, carro, negócio da família os pais dele eram donos de várias lojas de roupa na cidade e ganhavam bem.
Pensei que tinha encontrado o príncipe encantado. O Guilherme era o meu bilhete para uma vida sem preocupações. Sonhava com o casamento, o vestido de noiva, a lua de mel no Egito.
Mas, para ele, não passou de um romance passageiro. Vivi no apartamento dele apenas um mês, até que um dia, enquanto estava no salão a fazer as unhas, ele trocou a fechadura e pôs as minhas coisas na rua. A única explicação? “Somos de mundos diferentes. Não combinas comigo.” Como se eu fosse um sapato fora de moda!
A separação destruiu-me. Emagreci 15 quilos, parecia um fantasma. O cabelo caiu tanto que usei perucas e chapéus durante meses. A saúde piorou o emagrecimento brusco afetou-me por dentro. Fiz cirurgias, tomei remédios, até chás milagrosos. Nada funcionou.
Decidi focar-me na carreira. Adorava pintar unhas, tornei-me manicure. Com clientes fiéis e bom rendimento, consegui comprar um T2 com crédito bancário. Mais tarde, um carro. Aos 33, realizei o sonho: abri o meu próprio salão de beleza, com uma equipa de jovens talentosas.
Dois anos atrás, conheci o Rui. Trabalhava perto do salão e entrou um dia para trocar 20 euros. Foi amor à segunda vista. Passámos a viver juntos, casámos e começámos a pensar em filhos.
A idade complicava as coisas. Optei pela fertilização in vitro. Rezei muito, pedi a Deus que me desse a chance de ser mãe.
E Ele ouviu-me. Tive gémeos saudáveis, o parto foi tranquilo.
“Estás louca? Filhos nesta idade? Pensaste com a cabeça?” gritou a minha mãe ao telefone.
“Meu Deus, eu já estou quase a ser avó, e tu decides ter um bebé? Irmã, isso já não é para a tua idade!” berrou a minha irmã.
Nenhum familiar nos apoiou. À saída da maternidade, só me esperavam o Rui e o fotógrafo. Tiramos fotos e fomos para casa.
Os bebés já têm um mês. Nem a minha mãe nem a minha irmã querem visitá-los. Dizem que envergonhei a família toda por ter filhos tão tarde.
Mas será crime querer uma família? Será errado amar?